quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

PARCERIA

                                          
Nascemos sós. E por mais que a nossa busca maior na vida seja conviver com os outros, e por mais que a nossa volta hajam milhares de pessoas, vivemos e morremos sós. Somos sozinhos em nossos pensamentos, em nossos delírios oníricos, em nossos desejos secretos. Somos sós em nossas aspirações, conclusões e escolhas. E sendo assim, tão triste a realidade da solidão, parece estranho pensar que é a parceria quem torna a vida menos fugidia e mais cheia de sentido.

Temos parceiros no amor, na amizade, no jogo de volêi, nas brincadeiras da infância, nos trabalhos de escola. Algumas vezes, o parceiro é um amigo. Outras vezes, é um desconhecido útil. Outras vezes ainda, é só um parceiro. E em algumas vezes, nem mesmo gosta de você. Mas não faz mal. O importante é que os parceiros são aqueles que se unem para fazer algo em comum. E fazem.

Quando o assunto é parceria de trabalho, nem sempre há consenso. Algumas escolas não só não incentivam como proíbem que as professoras conversem e trabalhem juntas. Outras, obrigam o contrário, pensando que a parceria pode ser simplesmente institucionalizada como um bem necessário, imposta. Em algumas escolas, os parceiros se escolhem. Outras, são escolhidos. Acredito eu que o trabalho em parceria é algo que deve ser conquistado, refletido e repensado sempre, não como um arranjo técnico, mas como uma possibilidade democrática de convivência e construção do conhecimento pedagógico. Mas é difícil ver quem leve isso a sério. A verdade é que nesses quase 9 anos de magistério eu já vi muita coisa, mas poucas vezes vi alguém, em um momento de parada pedagógica, falar seriamente sobre a parceria, o que ela contribui para o trabalho do dia-a-dia e como pode ser melhorada. Acho que pensar melhor a parceria entre as professoras é uma mina de ouro que boa parte das escolas ainda não descobriram.

Esclareçamos. Estar junto nem sempre é estar em parceria. Parceiro não "rouba" idéias, compartilha. Parceiro não adula gratuitamente, mas puxa a orelha quando é necessário. Parceiro não esconde o que faz de bom, mostra para que você faça também. Parceiro não concorda com tudo, mas expõe os pontos de vista. Parceiro não puxa tapete, mas entende que o seu sucesso é o sucesso dele também. Parceiro avisa, dá um toque de que você está pisando na bola, esclarece aquele ponto que você não entendeu, contribui para que você cresça e aprenda. O parceiro é aquele que elogia quando ninguém parece dar bola para o que você faz, e critica contrutivamente o seu trabalho de uma maneira que só quem acompanha de perto pode fazer. O parceiro é uma extensão dos seus olhos, ouvidos e boca profissionais, e deixa que você seja alguém assim pra ele também. Como naquela corrida de bastões, como em revezamento de nadadores, como tênis de duplas, como esquema tático de futebol. Cada um na sua, mas todos juntos para um objetivo comum.

Nem sempre é preciso amizade em uma parceria, mas é preciso afinidade. Sem pensar parecido, parceiros não se entendem. Há experiências traumáticas, e talvez seja por isso que tem quem jure que é melhor trabalhar sozinho. Com certeza, é muito mais fácil fazer tudo do seu jeito do que tentar um acordo, principalmente se a diferença com a outra pessoa é grande. E em algumas horas, o trabalho solitário é necessário mesmo. Estar sozinho é bom para fazer coisas que ninguém pode fazer com e por você, para colocar em prática idéias que são só suas, e que você ainda não achou jeito de compartilhar. Há que se respeitar a individualidade para que ela não seja tão sufocada ao ponto de perdermos a identidade. Porém, na maior parte das vezes, é o trabalho em parceria que enche de riqueza as nossas vidas, nossas salas de aula.

Cada parceiro é de um jeito. Eu sou assim, meio desorganizada, detesto qualquer tipo de controle cego, não me submeto a uma rotina a não ser que me convença da necessidade dela. Sou bagunceira, escrevo demais, falo o mesmo tanto, misturo papéis, tenho idéias o tempo todo de um jeito quase compulsivo, dificilmente levo preocupações comigo que durem mais de uma semana e gosto de observar, intuir e sentir mais do que analisar, contabilizar e quantificar. E sendo desse jeito, já trabalhei com muita gente diferente de mim, e gente parecida também. E cada uma das pessoas com quem estive me acrescentou muitas coisas, mudaram coisas em mim. Tenho certeza que no trabalho que eu faço hoje tem um pouquinho de cada parceiro que já tive na vida.

Claro, nem sempre tudo é lindo, gostoso, divertido. O preço da parceria é a dificuldade do ajuste, do entendimento. É necessário abrir mão de algumas coisas, é necessário assumir erros que não são seus, é necessário ter paciência e muita clareza de objetivos. É necessário ter humildade para não bancar a sabichona o tempo todo, e ter segurança para sustentar o que se pensa quando se tem como parceiro alguém que sufoca. É necessário ter a sabedoria e o jogo de cintura para saber quando é a hora de respeitar as diferenças individuais e quando é a hora de modificar essas mesmas diferenças, sempre em prol de um bom trabalho. E tudo isso é um aprendizado longo, que nunca acaba.

Mas, pessoalmente falando, não posso reclamar, não. Sempre tive sorte nas minhas parcerias. Eu tenho boas lembranças dos parceiros com quem já estive. Alguns se tornaram bons amigos que eu guardo em lugar sagrado no coração, e vou guardar pra sempre. Outros, passaram e se foram. Mas sempre deixaram boas coisas comigo.

Por isso, quero agradecer a todos eles por terem me ensinado, dividido sorrisos e lágrimas, por terem xingado, concordado e discordado de mim, por terem dividido trabalho, por terem me ajudado e amparado, por terem sido companheiros em horas em que eu mesma não consegui ser. E um beijo especial para os integrantes do Saberes e Palavra Viva , por me aguentarem mais de perto esses últimos meses. :-)


"Sozinhos, vamos mais rápido.
 Mas juntos, chegamos mais longe."





Todos juntos

Para o musical infantil Os saltimbancos


Uma gata, o que é que tem?
- As unhas
E a galinha, o que é que tem?
- O bico
Dito assim, parece até ridículo
Um bichinho se assanhar
E o jumento, o que é que tem?
- As patas
E o cachorro, o que é que tem?
- Os dentes
Ponha tudo junto e de repente vamos ver o que é que dá

Junte um bico com dez unhas
Quatro patas, trinta dentes
E o valente dos valentes
Ainda vai te respeitar

Todos juntos somos fortes
Somos flecha e somos arco
Todos nós no mesmo barco
Não há nada pra temer
- Ao meu lado há um amigo
Que é preciso proteger
Todos juntos somos fortes
Não há nada pra temer

Uma gata, o que é que é?
- Esperta
E o jumento, o que é que é?
- Paciente
Não é grande coisa realmente
Prum bichinho se assanhar
E o cachorro, o que é que é?
- Leal
E a galinha, o que é que é?
- Teimosa
Não parece mesmo grande coisa
Vamos ver no que é que dá

Esperteza, Paciência
Lealdade, Teimosia
E mais dia menos dia
A lei da selva vai mudar
Todos juntos somos fortes
Somos flecha e somos arco
Todos nós no mesmo barco
Não há nada pra temer
- Ao meu lado há um amigo
Que é preciso proteger
Todos juntos somos fortes
Não há nada pra temer

E no entanto dizem que são tantos
Saltimbancos como somos nós.

Para o musical infantil Os saltimbancos 1977*
Postado por Djanira magalhães às 14:53
FONTE:http://djanira-magalhaes.blogspot.com

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